Dream Theater (2013): superando as expectativas

No mundo da música – ou da música que é levada a sério – é comum o “teste do segundo disco”. Após um bem sucedido primeiro álbum, a banda é de certa forma obrigada a superar o anterior, manter o número de vendas, shows, fãs etc.

Mas por que falar nisso em uma resenha do Dream Theater, banda que chega ao seu 12° lançamento, nomeado apenas como Dream Theater, em 2013? Justamente porque tal álbum é o segundo trabalho da banda sem o seu antigo líder, mentor e “dono”, Mike Portnoy, que foi substituído em 2010 pelo excelente e tecnicamente tão bom quanto, Mike Mangini.

A Dramatic Turn of Events (2011) foi ótimo e trouxe algumas características mais melódicas de volta à sonoridade da banda e seguiu-se uma turnê mundial de muito sucesso e uma aceitação completa do novo baterista – mesmo que os fãs do antigo sejam verdadeiros xiitas. 

Dream Theater (2013, produzido por John Petrucci) chega para mostrar que a banda continua no mesmo alto nível e com um detalhe importante: se no disco de 2011, Mangini não participou do processo de composição (tocou apenas o que  Petrucci havia programado com uma batreria eletrônica), desta vez o baterista se viu 100% participante e sendo assim podemos “julgar” também sua criatividade de composição em uma banda tão versátil como o Dream Theater. E o saldo é extremamente positivo.




Em False Awakening Suite a banda quis criar um tema tenso o suficiente para ser a abertura de um espetáculo. Petrucci e o vocalista James LaBrie já disseram que cansaram de usar trilhas sonoras de filmes clássicos para abrir seus shows e decidiram compor uma própria. E não fizeram feio. Com quase 3 minutos de duração, é cheia de nuances, complexidade e cria um clima de que algo grandioso está por vir e exatamente como um soco na cara vem o riff de The Enemy Inside, onde Mangini já mostra a que veio logo nos primeiros segundos, com linhas e viradas incríveis no ritmo completamente frenético da canção. Fácil de notar também uma participação mais “na cara” do baixista John Myung, que soa incrível em todas as faixas, além da guitarra bem heavy nas estrofes.

The Looking Glass tem riffs e levadas bem próximas ao hard rock (progressivamente falando) e tem tudo para ser um ponto alto dos shows – e ainda conta com um solo incrível em um tempo mais lento com uma base espetacular da cozinha Myung/Mangini. Um dos momentos mais bonitos aqui.

Um dos grandes destaques do trabalho é Enigma Machine, faixa instrumental que tem tudo o que os fãs da banda gostam: passagens quebradas, intrincadas, solos de guitarra, teclado, baixo e bateria, riffs pesados e melodias que ficam na cabeça. Ainda não supera The Dance of Eternity (faixa instrumental presente em Scenes From a Memory, de 1999), mas é a segunda melhor em toda a discografia dos americanos.

Bem na metade do play vem a balada The Bigger Picture, onde o feeling do vocalista e do guitarrista se destaca sobre o resto. Behind the Veil começa com um clima sombrio e triste criado pelo tecladista Jordan Rudess e prenuncia um tema pesado, com bastante groove e um refrão mais emocional que pode resultar em um grande momento ao vivo. Surrender to Reason é mais melódica e mostra a habilidade de John no violão e teve a letra composta pelo baixista John Myung. Along for the Ride tem um interessante solo de teclado com um timbre bem melódico de Rudess, que aliás fez um grande serviço no disco todo, e mostra aquilo que já escrevi sobre a veia mais melódica da banda estar de volta.


Para finalizar não podia deixar de ser a longa suíte com mais de 22 minutos de duração, The Illumination Theory. Se no lançamento anterior a banda dividiu a atenção nas longas composições, tendo pelo menos 4 com mais de 10 minutos de duração, neste play somente esta composição ultrapassa os 10 minutos. E ultrapassa duas vezes. Tem tudo o que uma longa suíte progressiva precisa ter: uma introdução climática, riffs pesados, boas melodias vocais, um bom refrão, um clima cinematográfico no meio da canção, que prepara para o solo de guitarra que antecede o gran finale de forma épica. Escrevendo assim parece fácil. Parece matemática. Mas pouca gente tem a capacidade e criatividade de criar algo assim e não espantar o ouvinte após os 5 primeiros minutos. O Dream Theater consegue deixar o ouvinte até o final e ainda pedir por mais.

Após ouvir por 4 ou 5 vezes, chega-se a conclusão de que a escolha do próprio nome para intitular o trabalho não foi à toa, porque mais Dream Theater do que Dream Theater, impossível. Tudo o que a banda já fez e tudo o que ela significa você encontra condensado nessas nove faixas.

Destaques individuais: Mike Mangini não deve temer a sombra de seu antecessor. A banda parece cada vez mais abraçar sua estadia e esquecer os fantasmas do passado. O baterista mostrou-se um ótimo compositor, criou linhas e viradas incríveis que aliados à sua sobre-humana técnica (podem sublinhar o sobre-humana) fazem um trabalho simplesmente espetacular. John Petrucci variou mais seus solos, usando efeitos e variantes que vão dos mais belos e suaves melodias até os mais frenéticos, passando pelos mais fusion, curiosamente podemos notar um pouco de cada dessas características na acima citada canção The Illumination Theory. John Myung aparece neste disco mais do que em qualquer outro nos últimos 10 anos, no mínimo. Linhas fortes e técnicas que farão os fãs do baixista ficarem em êxtase. James LaBrie não tem mais os agudos de antigamente e parece ter aprendido isso. Canta dentro da sua voz o álbum todo e não exagera em momento algum, indo até onde o seu limite atual permite. Jordan Rudess continua o mesmo mago dos teclados. O grande herói das teclas da era moderna. Grandes solos, grandes passagens climáticas, grandes bases e a já conhecida virtuose.

A lamentar somente a fraca capa.

Carlos H. Silva

Nota: 9.0


Track List:
1. False Awakening Suite:
I. Sleep Paralysis
II. Night Terrors
III. Lucid Dream
2. The Enemy Inside
4. Enigma Machine
5. The Bigger Picture
6. Behind the Veil
7. Surrender to Reason
8. Along for the Ride
9. Illumination Theory:
I. Paradoxe de la Lumière Noire
II. Live, Die, Kill
III. The Embracing Circle
IV. The Pursuit of Truth
V. Surrender, Trust Passion

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